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Estudo liga monocultura de eucalipto à falta Cancelar assinatura da lista: %1$s no semiárido em Minas

Jornal Estado de Minas

 

Tese indica que o eucalipto agrava o déficit hídrico no semiárido e ambientalistas defendem proibição de novos plantios. Produtores negam danos e rechaçam proposta


 

Pesquisa aponta que consumo de água do eucalipto é superior ao de plantas do cerrado. Reflorestadores ressaltam papel socioeconômico da cultura (foto: Luiz Ribeiro/EM/DA Press aberto 22/7/14)

 

Quase cinco décadas depois do início de sua implantação, a monocultura de eucalipto se tornou o principal fator de deterioração dos recursos hídricos no semiárido mineiro, afirma o técnico Walter Viana, responsável pela Fiscalização Ambiental na Superintendência de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Supram) do Norte de Minas e autor de tese sobre a desertificação na região. Como medida para combater o déficit hídrico provocado por essa cultura, ambientalistas defendem a proibição de novos plantios na região, enquanto empresas reflorestadoras negam os danos e rechaçam a proposta, lembrando que o setor responde por 9% do Produto Interno Bruto (PIB) mineiro.

 
De acordo com estudo coordenado por Viana, a cultura de eucalipto consome 230 litros de água por metro quadrado plantado a mais que o cerrado. Além disso, provoca o rebaixamento do nível freático em meio metro por ano. Da média histórica de precipitação pluviométrica no Norte de Minas, de 1 mil milímetros/ano, o eucalipto sozinho consome 800 milímetros. Como o cerrado precisa de 500 milímetros, há um déficit de 300 milímetros, explica o estudo. A cultura, que chegou ao semiárido no começo da década de 1970 com incentivos fiscais, hoje ocupa uma área estimada em 1,5 milhão de hectares na região e é usada para a produção de carvão vegetal, que abastece o polo siderúrgico mineiro (Sete Lagoas e municípios próximos da Região Metropolitana de BH).
 
A proibição de novas áreas de plantio de eucalipto no semiárido foi uma das demandas levadas ao governo estadual na Carta das Águas, um diagnóstico dos problemas ambientais do Norte do estado catalogados durante a 5ª Expedição Caminhos Gerais. Organizada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Montes Claros e integrada por um grupo de técnicos e ambientalistas, a expedição percorreu a região em setembro. O diagnóstico foi encaminhado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).
 
O documento foi entregue ao secretário-adjunto de Meio Ambiente, Germano Luiz Gomes Vieira, por uma comitiva formada pelo secretário de Meio Ambiente de Montes Claros, Paulo Ribeiro, e outros participantes da Expedição Caminhos Gerais. Os danos à natureza foram discutidos em reunião na Semad, que contou com as presenças de técnicos e representantes de órgãos ambientais do estado, como a presidente do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), Marília Carvalho de Melo. O secretário adjunto Germano Vieira se comprometeu a se reunir com o Instituto Estadual de Florestas (IEF) para discutir o assunto. Ele pretende ainda fazer reunião com produtores de eucalipto.

DEFESA A diretora-executiva da Associação Mineira de Silvicultura ( AMS), Adriana Maugeri, disse desconhecer a existência de estudos que mostrem consumo elevado de água pela cultura do eucalipto. “Essa informação não procede de forma alguma. O estudo de que temos conhecimento revela que o consumo de água do eucalipto é como o de qualquer outra cultura, como a soja e o café, por exemplo. Também depende de vários fatores, como o tipo de solo”, argumentou Adriana, sem, no entanto, citar números.

Ela disse reconhecer o problema da crise hídrica e o agravamento da situação no Norte do estado, onde são visíveis os sinais de desertificação. “Como foi escrito na própria Carta das Águas, o problema é consequência das alterações climáticas e de vários fatores ao longo dos anos, inclusive do próprio aumento do consumo humano (de água). Toda atividade tem seus impactos. Não se pode apontar um único culpado”, defendeu a diretora-executiva da AMS.

Adriana Maugeri afirmou que a AMS é frontalmente contra a ideia de qualquer suspensão de novos reflorestamentos de eucaliptos no semiárido mineiro. “Os plantios de eucaliptos no estado são feitos com manejo sustentável e correto”, assegurou, lembrando que a Associação de Silvicultura conta com 21 reflorestadoras que têm certificação internacional (FSC) pelo manejo sustentável de florestas. Ela ressaltou ainda que a manutenção da atividade é de fundamental importância para a economia do estado, tendo em vista que o setor gera 379 mil empregos diretos e indiretos e responde por 9% do PIB mineiro.

 

CARÊNCIA DE CHUVAS Além do desastre ambiental provocado pela monocultura do eucalipto, os rios e córregos do Norte do Estado e o Vale do Jequitinhonha tiveram o volume diminuído por causa da drástica redução de chuva nas duas regiões nos últimos seis anos. Estudo divulgado pela Semad revela que 2013 para cá a situação se agravou nas bacias dos rios São Francisco e Jequitinhonha porque o volume pluviométrico entre os meses de outubro e março (período chuvoso das duas regiões) ficou muito abaixo da média histórica. No ano chuvoso 2014/2015, o volume de chuvas foi 26% a menos do que o esperado.

 

O Norte de Minas é uma das regiões mineiras onde a população mais sofre com a crise hídrica, que afeta toda Minas Gerais, com 265 municípios em emergência, como mostrou revelou o Estado de Minas, em sua edição de segunda-feira.

 

Carta das águas

Confira as medidas propostas para conter o avanço dos danos ambientais no Norte de Minas

1 – Proibição de novas áreas para plantios de eucalipto;
2 – Monitoramento dos níveis freáticos para que haja novos parâmetros para emissão de outorga no Norte de Minas;
3 – Ampliação do Parque Estadual Veredas do Peruaçu, a partir da aquisição de terras de proprietários que têm dívidas com o estado e estão dispostos a negociar;
4 – Criação do Parque Estadual de Botumirim, importante reserva para a manutenção da biodiversidade e dos mananciais hídricos;
5 – Criação da Unidade de Conservação de Pandeiros, o pantanal mineiro.

 

Palavra de especialista

Maria das Dores Magalhães Veloso, pesquisadora em ecologia da Unimontes

O rastro da crise

“A crise hídrica tem deixado um rastro de desespero nas comunidades rurais, como os veredeiros e geraizeiros. Com o secamento dos rios e pequenos córregos não há como essas pessoas executarem as atividades mínimas de que um ser humano precisa. Em sua grande maioria, essas comunidades são abastecidas por carros-pipas, com restrições de armazenamento, ou percorrem longas distâncias para buscar água, tomar banho, lavar roupas etc. Algumas famílias de veredeiros estão abandonando suas terras, pequenas glebas, e migrando para a periferia das cidades, vivendo de forma miserável, sem nenhuma orientação ou ajuda, criando um novo sistema de favelas. As vítimas da seca no sertão norte-mineiro não são apenas as populações. Ela tem afetado de forma ímpar a biodiversidade. É perceptível o secamento das veredas, uma vez que com o rebaixamento do lençol freático. Acarreta na morte de espécies vegetais adaptadas a solo úmido. Nesse contexto, tanto a fauna quanto a flora do cerrado norte-mineiro tendem a desaparecer em um curto prazo, o que, consequentemente, implica processo de desertificação.”