COMUNICADO DE IMPRENSA
Estados do Sul global e sociedade civil mantêm o momentum para regular as corporações transnacionais na legislação internacional de direitos humanos
De 25 a 29 de outubro, os Estados-Membro das Nações Unidas prosseguiram com as negociações para a elaboração de um instrumento internacional legalmente vinculativo (LBI, na sigla em inglês) para regular, na legislação internacional dos direitos humanos, as actividades das corporações transnacionais (CTNs), incluindo todos as empresas ao longo das suas cadeias globais de produção. Este processo histórico celebrou a sua sétima sessão do Grupo de Trabalho Intergovernamental de Composição Aberta (OEIGWG, na sigla em inglês), organizado pelo Conselho de Direitos Humanos no Palais des Nations em Genebra.
A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, abriu a sessão defendendo que o mundo está a testemunhar um “crescente consenso sobre a necessidade de normas vinculativas sobre empresas e direitos humanos”.
As negociações em torno do Tratado Vinculativo da ONU aberto como é comumente conhecido aberto deram um salto qualitativo com a nova metodologia adoptada para esta sessão, que trouxe transparência e incentivou os Estados a posicionarem-se sobre a linguagem específica do texto draft do tratado. Um total de 69 Estados participou na sessão, ao longo de toda a semana. Mais importante ainda, alguns conteúdos principais e indispensáveis foram reintroduzidos e defendidos por alguns Estados, de acordo com o mandato da Resolução 26/9, com vista a preencher as lacunas do direito internacional dos direitos humanos que permitem a impunidade das empresas transnacionais. Entre outros, notamos a positiva e construtiva participação da África do Sul, Egipto, Palestina, Camarões, Namíbia, Panamá e Cuba.
A este respeito, Julia Garcia, do Movimento Atingidos por Barragens (MAB) e coordenadora da Campanha Global, afirmou: “Celebramos o fato de que muitos Estados estão a negociar obrigações legais diretas e claras para as empresas transnacionais e outras empresas com atividades transnacionais, superando as limitações normativas a nível nacional, que contribuem para a impunidade. Queremos destacar a importância das propostas que têm defendido a primazia dos direitos humanos sobre os direitos das empresas em toda a cadeia produtiva global”.
Como todos os anos, foi fundamental o papel da sociedade civil, defendendo a continuidade deste processo e fornecendo análises detalhadas, argumentos fortes e propostas de conteúdo muito concretas. A Campanha Global para Reivindicar a Soberania dos Povos, Desmantelar o Poder Corporativo e Acabar com a Impunidade (Campanha Global), representando 260 milhões de pessoas globalmente afetadas por corporações transnacionais, participou diretamente nas negociações, retomando parcialmente a presença física que no ano passado não foi possível devido à pandemia do COVID-19.
“Acesso às vias de recursos, a reparações e à justiça têm se tornado uma luta intergeneracional repleta de obstáculos”, declarou Joseph Purugganan, da organização Focus on the Global South e da Asian Task Force on the Binding Treaty. Continuou defendendo que “face às assimetrias de poder que predominam na maioria dos países, a protecção dos indivíduos e comunidades afectadas, através da criação de mecanismos fortes de acesso à justiça e a reparações, deve ser uma prioridade neste processo”.
Hugo Barretto, assessor da Confederação Sindical das Américas (TUCA), reiterou que a Campanha Global defende um “tratado ambicioso e eficaz com regras vinculativas de direitos humanos para empresas transnacionais e as demais empresas nas suas cadeias globais de produção, que são em grande parte responsáveis pela crise climática e da biodiversidade, pela exploração do trabalhador, e pelos actuais níveis de desigualdade sem precedentes. A conduta reprovável destas empresas põe em risco o futuro da humanidade e do planeta. ”
Raffaele Morgantini do CETIM explicou “Alguns Estados ocidentais e representantes de empresas defenderam repetidamente a relevância dos actuais quadros voluntárias, e até fizeram tentativas frustradas de sugerir alternativas ao Tratado Vinculativo, como parte de uma estratégia liderada pelos EUA para enfraquecer o processo e promover caminhos alternativos e fúteis. No entanto, a necessidade de dar um passo significativo e encontrar formas inovadoras de colmatar as lacunas jurídicas que ainda existem a nível internacional foi sentida de forma preponderante durante toda a semana. Vale destacar também que vários Estados reconheceram a importância da participação da sociedade civil e o valor das nossas propostas.”
No entanto, existem algumas preocupações sobre o risco de perda de transparência do processo. Erika Mendes, da Justiça Ambiental / Amigos da Terra Moçambique afirma que este é o caso, particularmente, “na próxima etapa do processo de negociações, que irá avançar no formato do denominado ‘Grupo de Amigos do Presidente’ durante o período entre sessões. É importante que a nova metodologia de negociação entre Estados garanta a participação da sociedade civil, e que a voz das comunidades afectadas seja ouvida e considerada. Ao mesmo tempo, apelamos ao Presidente do OEIGWG e aos Estados para que protejam o processo da influência nefasta de poderosas corporações que, em vez de defender os direitos humanos, fazem lobby pela protecção dos seus próprios interesses económicos”.
Fernanda Melchionna, deputada federal do Congresso Nacional Brasileiro e membro da Rede Global Interparlamentar (GIN) em apoio ao Tratado Vinculativo declarou: “A luta por um Tratado Vinculativo que regule o poder das transnacionais e coloque os direitos humanos e ambientais acima do poder corporativo é uma luta estratégica e fundamental para o mundo. O papel que cumpriu a Campanha Global, de articulação e mobilização para não deixar que países retirassem a essência do texto, é a demonstração de que a sociedade civil, as populações atingidas e os movimentos sociais têm um contributo fundamental para este processo.”
A Campanha Global continuará com o seu compromisso de garantir que o processo se mantém fiel ao espírito e à ambição da Resolução 26/9. Para tal, mobilizamo-nos a nível nacional para garantir que os nossos governos participem activamente nas negociações, representando as necessidades e aspirações dos povos de cada país.
NOTA PARA EDITORES
Para mais informações ou para organizar entrevistas, contactem:
Sol Trumbo Vila, Email: soltrumbovila[a]tni.org
Julia García, +55 71 9246-2696 Email: facilitation[a]stopcorporateimpunity.org
A Campanha Global para Reivindicar a Soberania dos Povos, Desmantelar o Poder Corporativo e Acabar com a Impunidade (Campanha Global) é uma rede de mais de 250 Movimentos Sociais, organizações da sociedade civil (OSCs), sindicatos e comunidades afetadas pelas atividades das empresas transnacionais (TNCs), representando 260 milhões de pessoas em todo o mundo. https://www.stopcorporateimpunity.org
Esta rodada de negociações está revisando o terceiro rascunho do tratado vinculante, publicado a 17 de Agosto de 2021, que faz parte do processo de negociações iniciado em 2014 com a adopção da Resolução 26/9 por parte do Conselho de Direitos Humanos. Informação da ONU sobre o mandato do OEIGWG.
A Campanha Global publicou esta declaração em Setembro de 2021 em resposta à publicação do terceiro rascunho revisado.
A Rede Global Interparlamentar de apoio ao Tratado Vinculante é uma rede mundial de parlamentarias/os nacionais e membros do Parlamento Europeu que apoiam o Tratado Vinculante da ONU. https://bindingtreaty.org/